Verão de 2014 - Tão quente só em janeiro de 1953 segundo Diário de Notícias da época


As agruras de um verão tão quente quanto poucos anteriores geravam uma frequência fora do comum nos balneários do Guaíba.

Maillots de variadas matizes eram ostentados por elegantes jovens em busca de refresco para o "calor senegalesco" que se fazia sentir nestas paragens.

Assim o jornal Diário de Notícias descrevia os "week-ends" daquele janeiro de 1953, "por certo o mais abrasador desta época do ano". E era mesmo. Dados do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) desde 1916 apontavam janeiro de 1953 como o mais quente de todos, com média de temperaturas máximas de 32,7ºC. O recorde foi quebrado agora, em 2014, com média de 33,1ºC.

Folheando as páginas amareladas dos arquivos do Museu da Comunicação Hipólito José da Costa em busca do relato jornalístico do último calorão histórico da Capital, deparamos com notícias sobre uma Alemanha ainda dividida em duas, e um terrível surto de gripe que causava centenas de mortes nos Estados Unidos, enquanto no Brasil o governo Vargas enfrentava uma profunda crise com inflação em alta e greves fervilhando. Na cobertura local, os confrontos do campeonato estadual de futebol, com destaque para os clubes do interior, os bons resultados da produção rural gaúcha, além de relatos de arrombamentos e "contos do bilhete" no plantão policial.

Anúncios de maillots se destacavam ao lado de canetas-tinteiro, rádios de mesa e outros produtos fora de linha há tempos. As temperaturas recordes ganhavam espaço no noticiário com textos até bem-humorados e, claro, fotos de mulheres bonitas. "Quem estivesse observando o termômetro logo ficaria assombrado de ver o mercúrio subindo implacavelmente", dizia uma nota publicada em 21 de janeiro de 1953.

Se em 2014 as fotos do governador Tarso Genro de sunga em Capão da Canoa viraram meme na internet, em 1953 o então governador Ernesto Dorneles foi fotografado de calção nas areias de Tôrres (com acento, na grafia da época) ao lado do presidente do Legislativo Vitor Graeff e do chefe do poder cultural Eliseu Paglioli, no que foi chamado pelo jornal de "banho dos três poderes".

Enquanto isso, a facilidade do acesso barato e rápido à beira do Guaíba proporcionava ao "porto-alegrense menos afortunado o saudável prazer de se por em contato com a natureza", conforme coluna publicada em 17 de janeiro de 1953. Em tom opinativo, o texto apontava para problemas da época — alguns até hoje sem solução, contrariando a torcida no fecho do texto: "É verdade que as praias do Guaíba carecem de conforto e deixam muito a desejar, mas para opor a essas deficiências lamentáveis temos o bom-humor do porto-alegrense, que enfrenta, com espírito jovial e desportividade, a tragédia do transporte nos irritantes ônibus da Prefeitura, e a ausência de um serviço de bar organizado. Mas um dia a coisa vai melhorar!".

Desde aquela Porto Alegre de 61 anos atrás, quase tão abrasante quanto a Capital de agora, as praias do Guaíba deixaram de ser refúgio, já que a maioria hoje está imprópria para banho. Onde o banho ainda é possível, há pouca estrutura. 

Matéria Zero Hora - 1º de fevereiro de 2014

Nenhum comentário: